Alemanha, França, Canadá (rodado na Patagônia Argentina e em Munique) | 105min | 35 mm |cor
Roteiro: Hans-Ulrich Klenner, Walter Saxer e Robert Geoffrion, a partir de ideia de Reinhold Messner
Direção: Werner Herzog
Produção: Walter Saxer
Som: Manfred Arbter
Montagem: Suzanne Baron
Fotografia: Rainer Klausmann
Música: excertos de Heinrich Schiitz, Richard Wagner, Sarah Hopkins, Alan Lamb, Ingram Marshall e Atahualpa Yupanqui
Elenco: Vittorio Mezzogiorno (Roccia), Stefan Glowacz (Martin), Mathilda May (Katharina), Donald Sutherland (Ivan), Brad Dourif (Senzadita), Al Waxman (Stephan), Chavela Vargas (senhora indiana), Hans Kammerlander (escalador), Volker Prechtl (mestre himalaio)
Schrei Aus Stein (Grito De Pedra), lançado no Brasil como No Coração Da Montanha,
é um trabalho atípico de Herzog: o roteiro foi escrito pelo colaborador
de longa data Walter Saxer, junto com dois amigos, a partir de uma
ideia do montanhês Reinhold Messner, protagonista de Gasherbrum – Der Leuchtende Berg.
Basicamente a história é sobre dois alpinistas, um jovem e impetuoso (Martin) e um experiente e amargurado (Roccia) disputando entre si pra ver quem é melhor montanhista, tem o ego mais inflado e fica com a mocinha do filme (a bela Katharina), tudo sob o controle do ambicioso empresário televisivo Ivan. E o palco central de tudo isso é o imponente e perigoso Cerro Torre, na Patagônia.
Falando assim, a história parece banal – e de fato é: apesar de possuir elementos extraídos da história da suposta primeira conquista de Cerro Torre, em 1959, pelo escalador italiano Cesare Maestri e seu parceiro, o austríaco Toni Egger (que morreu durante a descida), tudo se desenvolve de forma muito rápida e forçada, não dando tempo nem motivos para que nos identifiquemos com os personagens (ou mesmo desgostemos deles). As pessoas vão, vem, vivem, morrem, vencem, perdem e você fica indiferente.
Basicamente a história é sobre dois alpinistas, um jovem e impetuoso (Martin) e um experiente e amargurado (Roccia) disputando entre si pra ver quem é melhor montanhista, tem o ego mais inflado e fica com a mocinha do filme (a bela Katharina), tudo sob o controle do ambicioso empresário televisivo Ivan. E o palco central de tudo isso é o imponente e perigoso Cerro Torre, na Patagônia.
Falando assim, a história parece banal – e de fato é: apesar de possuir elementos extraídos da história da suposta primeira conquista de Cerro Torre, em 1959, pelo escalador italiano Cesare Maestri e seu parceiro, o austríaco Toni Egger (que morreu durante a descida), tudo se desenvolve de forma muito rápida e forçada, não dando tempo nem motivos para que nos identifiquemos com os personagens (ou mesmo desgostemos deles). As pessoas vão, vem, vivem, morrem, vencem, perdem e você fica indiferente.
O temido Cerro Torre |
O conflito entre os montanhistas é abrupto e sem propósito, e os próprios traumas deles não convencem muito; a mocinha só está no filme para ser a mocinha mesmo; e as atuações são sofríveis – Donald Sutherland bem que tenta, mas seu personagem também não diz muito ao que vem.
Herzog também se esforça, dando um subtexto de crítica à sociedade do espetáculo, em que tudo é feito para a mídia, e só existindo se nela estiver, mas as atuações fraquíssimas da dupla de atores principais atrapalha isso também.
Fingerless, escalador de quatro dedos de uma mão, perdidos em Cerro Torre, e obcecado com a atriz Mae West (?), é o único personagem interessante do filme (“o único personagem do script original em quem eu fui autorizado a fazer mudanças” ¹, segundo o diretor), a despeito de suas falas serem fracas também: atormentado pela montanha, que lhe tirou não só pedaços de seu corpo, mas também sua sanidade, vaga pela história para nos lembrar de que estamos num filme de Herzog, dando o toque de desajuste social mínimo ao longa.
Aliás, Werner Herzog também não gosta do filme, inclusive se mostrando arrependido de tê-lo feito: “Havia algo maravilhosamente físico na história que achei interessante, mas o script tinha muitos pontos fracos, especialmente os diálogos, e precisava de um trabalho real, então eu hesitei em aceitar o projeto, porque a princípio eu não sabia como poderia melhorá-lo. Finalmente chegamos a um acordo e eu entrei no filme, mas imediatamente me vi sem saída, quando tive que fazer alterações substanciais". ²
Aí vem a pergunta usual: mas nada no filme presta?
Olha, este é, sem dúvida, o pior filme do Herzog que já vi. Supera, de longe, Massnahmen Gegen Fanatiker (pelo menos tinha caráter experimental), Herz Aus Glas (visualmente bem mais interessante), Huie’s Sermon (há certa atração em sua catarse), Cobra Verde (Klaus Kinski sempre vale a pena) e Jag Mandir (pelo menos é mais curto).
Como eu já disse, a história se desenvolve de um jeito bastante tolo, os diálogos e as atuações dão raiva de tão ruins (dá até pena do Donald Sutherland no meio daquilo) e toda a história (que nem é tanta assim) parece mera enrolação para o duelo final entre os protagonistas.
Herzog já não leva muito jeito para histórias lineares/comuns (e nem parece se intressar muito por elas), mas nem os piores momentos de Wo Die Grünen Ameisen Träumen parecem tão jogados quanto as discussões entre o triângulo amoroso principal, as aparições do Fingerless com suas frases de efeito ou a ‘Indianerin’, uma senhora indígena que aparece, de certa forma, comentando a história com frases apocalípticas de efeito (pelo menos tem um quê de herzogiano nisso).
Salva-se o clímax, em que o diretor finalmente arregaça as mangas fazendo o que sabe melhor: mostrar homens obstinados em conflito com a natureza impiedosa. As cenas de escalada no Cerro Torre, aparentemente sem qualquer trucagem, são de tirar o fôlego.
Em suas próprias palavras: "[Walter] Saxer estava muito teimoso com tudo, por isso não posso nem dizer que Schrei Aus Stein seja meu filme, embora ele contenha algumas sequências impressionantes, como que Stefan Glowacz escala uma montanha verticalmente, em seguida horizontalmente e então verticalmente de novo, tudo sem uma corda de segurança, tudo em um único take, tudo com uma paisagem impressionante atrás dele e um abismo escancarado abaixo. É a coisa mais extraordinária que você verá na tela, muito mais do que qualquer coisa em um blockbuster de Hollywood”. ³
Grandes cenas de montanhismo |
A tomada final, logo após o desfecho da disputa entre os montanhistas – que, aliás, tem uma surpresa que dá uma melhorada temporária na experiência do filme – também é muito boa, como repara o especialista norte-americano em cinema alemão Brad Prager: “O significado produzido pela montanha oferece o insight para o gesto formal mais consistente de Herzog, a panorâmica de 360º. Não apenas no fim de Schrei Aus Stein, mas também nos finais de Herz Aus Glas e Aguirre, Der Zorn Gottes, com o objetivo de delinear um espetáculo desesperado de desesperança, a câmera circunda ao redor dos protagonistas em desespero”. 4
Então minha recomendação é: acelere o filme direto para os últimos 20min e veja belas e sombrias tomadas na natureza fria e selvagem, sem precisar passar raiva com o resto. No mais, não recomendo Schrei Aus Stein nem para fanáticos por Herzog, nem para entusiastas do montanhismo.
Curiosidades:
– originalmente, o próprio Reinhold Messner estrelaria o filme (no papel de Roccia), mas Herzog, baseado em seu contato com ele em Gasherbrum – Der Leuchtende Berg, achou que ele não daria conta do papel;
– Herzog faz um ponta na primeira sequência do filme, como parte da equipe de televisão que vai transmitir a escalada indoor de Martin;
– dá pra ver o filme no YouTube (qualidade de VHS antigo), com legendas em português.
1 3 HERZOG, Werner. In.: Werner Herzog: A Guide For The Perplexed, de Paul Cronin. Faber & Faber, 2014.
2 HERZOG, Werner. In: Herzog On Herzog, de Paul Cronin. Faber & Faber, 2001.
4 PRAGER, Brad. The Cinema Of Werner Herzog: Aesthetic Ecstasy And Truth. Wallflower Press, 2007.
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