quinta-feira, 22 de maio de 2014

(1976) Mit Mir Will Keiner Spielen


Alemanha (Munique) | 14min | 16 mm | cor
Roteiro, produção e direção: Werner Herzog
Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus
Fotografia: Jörg Schmidt-Reitwein
Som: Haymo Henry Heyder
Elenco: não creditado


Tentei descobrir como crianças de cinco ou seis anos percebem as coisas.” ¹

Feito sob encomenda para o Institut fur Film und Bild in Wissechaft um Unterricht (Instituto para o Cinema Científico e Didático), este adorável curta-metragem (cujo título significa "Ninguém quer brincar comigo") gira em torno de crianças da pré-escola (que, aliás, atuam com muita naturalidade), e seu roteiro foi escrito com base em experiências que os próprios atores-mirins contaram ao diretor.

Aparentemente é uma tentativa de campanha para que as crianças sejam mais sociáveis e compreensivas inclusive com os coleguinhas que acham “estranhos”. Para o estudioso de cinema alemão Brad Prager, no entanto, “em sua essência, esse filme é mais sobre a virtude de compartilhar”. ²

A história é bem simples: Martin é um menino que fica isolado do resto da turma, sozinho no canto da sala, porque ninguém quer brincar com ele. As outras crianças comentam entre si que ele é sujo, usa roupas velhas, mora numa casa feia, não tem o que comer (só come pipoca), e por isso o rejeitam.

Antes só...

Com algum esforço, Martin convence uma colega de sala, Nicole, a ir até a casa dele, para ver seu corvo falante de estimação. E então conhecemos seu corvo, sua casa, e descobrimos o porquê de o garoto parecer meio abandonado.

Daí o filme alterna momentos muito bonitos, como a alegria do saltitante Martin por finalmente ter uma amizade (ele até dá seu corvo de presente à menina), e a descoberta desse sentimento por parte de Nicole (“Esse idiota é meu amigo!”), com outros mais melancólicos, quando conhecemos a dura realidade familiar do garoto. E o final, apesar de tudo, é feliz e tocante, com direito à reconciliação com a turma e a um par de porquinhos-da-índia.
...depois bem acompanhado.

Não tem cara de filme do Herzog, eu sei. É bem mais singelo, delicado, ingênuo mesmo, do que a filmografia costumeira do diretor. Afinal, sabemos que o alemão não costuma se envolver muito nos projetos que faz sob encomenda.

Também não sei o que o tal Institut fur Film und Bild in Wissechaft um Unterricht tinha na cabeça quando chamou Werner Herzog para fazer um filme infantil – sim, pois o público-alvo, não se esqueçam, são crianças da idade de Martin e Nicole.

O resultado, até pelo aparente pouco interesse do diretor (não duvido de que ele nem se lembre deste Mit Mir Will Keiner Spielen), é um filme tecnicamente cru (parece um documentário) e de resolução final um tanto corrida (até pelo curto tempo de projeção).

Mesmo assim, recomendo vê-lo, até porque é bem curto. E, de certa forma, temos, em formato mirim, um autêntico personagem hergoziano em Martim, inadequado, desolado, solitário, um tanto esquisito. Não é uma ruptura em sua obra.

E vale o ensinamento que o filme traz: 

Não existem crianças-problema, apenas pais-problema.” ³


Curiosidade:

- o corvo da história é uma óbvia referência ao animal que acompanhava a solitária infância do protagonista de Die Große Ekstase Des Bildschnitzers Steiner.


¹ PAGANELLI, Grazia. Sinais De Vida: Werner Herzog E O Cinema (Segni Di Vita: Werner Herzog E Il Cinema, 2008). Editora Indie Lisboa, 2009.
² PRAGER, Brad. The Cinema Of Werner Herzog: Aesthetic Ecstasy And Truth. Wallflower Press, 2007.

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